quarta-feira, 31 de julho de 2013

A Presença do Verde

Tudo verde. Um verde escuro... musgo. Onde estou? Está tudo tão escuro... verde escuro musgo. Paredes pintadas. Uma família pintada na parede, dadas as mãos. O pai com uma camisa e o símbolo da paz. Onde está a paz, se tudo que vejo é verde, verde escuro musgo.
Gritos, esses gritos que habitualmente chamam silêncio, choram pela madrugada. E ela ali, sem sonhos deitada numa cama... que incrivelmente é verde, verde escuro musgo. Não sabe por que esta presa num lugar verde como esse... e essas pessoas de verde?
- Você tem medo das pessoas de verde? Pergunta alguém diante de uma pergunta fugaz e insistente.
- Vocês não vão tirar a minha família de mim, né? Sem eles eu morreria... sem eles eu morro!!!
Há tristeza nas manhãs que geralmente são verdes... porém o céu lá fora é magnifico e lindo, de um incrível azul que contrasta com o imenso verde... verde escuro musgo. Dias de agonia. Como ela foi parar ali? Sem entender, sem se ver e ser vista!
- Meus amigos... onde estão e por que essas paredes são tão verdes???
Na verdura da imensidão do quarto, sozinha num ponto verde mais claro, mais calmo ouve-se os gritos que tem as ondas verdes, habituais e incessantes como o medo, que na imensa verdição é verde, verde escuro musgo... Nem em momentos tão intensamente verdes, ela lembrava-se de tanto verdor assim... Essa cor que lhe acompanha e lhe enlouquece.... Esse verde que não lhe larga e quase lhe entristece...

Longe de tudo, longe das cores que só na rua se encontram.... Essa cadeia verde, com pessoas que se vestem de verde... Um lugar verde... Medo verde! Sem esperança, que por sinal é verde!

terça-feira, 30 de julho de 2013

Um escrito atrás do livro de poesias de Álvaro de Campos

Foi folheando o livro de Álvaro de Campos – costume bobo de querer ler tudo olhando só de relance – que vi o que, até então, não pensava.
Gosto de ler o que as pessoas escrevem em livros, acho interessante.  A graça de se comprar livros usados vai além da economia. As vezes tenho o costume de comprar livros velhos pra sentir a poeira de outra casa, de outra vida, imaginar as mãos que os tocaram, quantos gostaram e quantos os desprezaram... o certo, e por isso mesmo prazeroso de se ter livros usados, é nunca poder descobrir isso...
Certa vez, parei em frente a um Sebo, esses lugares que vendem livros usados, e como perto de lá havia uma árvore linda, com uma copa sombreada, resolvi sentar-me  em baixo dela  e observar as pessoas com os livros. Tinha o olhar quase como de um cientista, mas profundo como de um poeta. O interessante do Sebo é que este era todo vidraçado, e por conta disto, podia ver todos as pessoas juntas, num lugar pequeníssimo e cheio de livros. E mais curioso ainda, por conta do reflexo nos vidros, podia ver rostos em cima de rostos, expressões faciais em cima das outras, cores difusas aparecendo e desaparecendo pelo sol que ora aparecia e percebi....
Não percebi!
Fiquei a olhar, e querendo ver tudo, não vi nada...
Não percebi....
Então entrei na lojinha envidraçada e comprei um livro... e pela primeira vez não o folheei como de costume e nem fiquei na duvida... Vi o livro de poesias de Álvaro de Campos e levei pra casa.
Quando chego em casa com livros que nunca li ocorre quase um ritual. Pego as chaves de casa, cuidadosamente, abro a porta discretamente. Passo pela sala, pela cozinha, olho o banheiro, o quarto, abro todas as janelas e contemplo a cidade – as vezes tenho a impressão de ver toda ela de cima da minha casa, e me encanto mais e mais de ver e ouvir todos os sons que a cidade no seu vigor tem . Entro no quarto, retiro o livro da sacola e o contemplo por alguns segundos deixando-o na cabeceira... Tomo um banho, daqueles que tiram todo o cansaço e o peso de todos os olhares, e esquece-se todas as amarguras, e abandona-se todos os achismo... molho os cabelos com toda a liberdade que a água ao cair no rosto proporciona... banho-me como que caísse em um rio límpido e belo. Enxugo-me devagar, e busco a roupa mais leve e macia para usar. A sensação de retirar todas as impurezas nos dá alivio e sensações indescritíveis.
Sento-me a cama e  pego o livro e.... o folheio...
Folhear o livro de Álvaro de Campos foi diferente, não houve pensamentos que me aturdissem, não houve tentativas de descobertas... Não tentei imaginar seu antigo dono, nem como este o lia, nem como ele o pegava, se ele o inspirava, se era para estudos.... Vi escritos apenas em cima e aos lados dos poemas, dos versos, das palavras como se fosse uma cópia de tudo ali escrito... E me aturdi com o mais improvável... um escrito atrás do livro de Álvaro de Campos... Quase que o inicio de um poema...  Não pensei, e vi

De repente tudo se és... vai
E tudo perde sem.... tido
Como se nunca houvesse existido
Mas recordo o gosto de algo
De um não sei o quê
Apenas vivi intensamente
Nunca deixará de ser Real.


- Fechei o livro e nunca mais dormi!